sábado, 25 de dezembro de 2010

Parentada

à Maria Fulô, nossa árvore-de-natal-cabide que eu nominei mandacaru

Não sei se é culpa das tais novas tecnologias ou se tal situação é inversamente proporcional ao meu crescimento (neste ano me tornei mais alta que minha mãe, gente!). Talvez também seja pelo estilo meio chita de correr o tempo neste ano tão rápido. Só sei que cada vez mais sobra espaço na casa, que antes lotava durante o natal. Eram bonitos os natáis daqui de casa -- pela noite, a casa inteira virava uma suculenta mijadra (prato árabe típico de vovó) de filhos, primos, tios, avós, tios-avós, primos-tios, filhos-netos, todas essas confusões dignas de novela mexicana e vez em quando até vizinhos tinham presença garantida. Talvez o espaço superlotado se dividisse em três: parentes, comilança e presentes. Hoje em dia, cadê? A criançada cresceu e não ganha mais bicicleta. Nem caixas gigantescas de bonecas medonhas e trilíngues. Nem os envenenados carros de fricção maiores que cabeça de criança. Tudo pequeno (digamos minimalista, que atualmente é um termo que está na moda), a gente ganha celular, dinheiro, emepetrês, livro ou devedê. Acho ótimo, pois meu saldo desse ano foi Walden, A Esperança e ainda posso tomar a liberdade de usufruir d'O Caçador de Pipas, Outra Vez (do Che) e cedês da Elis e do Bosco, tudo presente que parentes mais próximos ganharam. 

A esposa de meu tio tem família no Paraná, e lá foram eles comemorar o natal, levando junto a Maria Júlia e o João, os pequininíssimos que ainda esperavam a chegada de Papai Noel com um saco cheio de presentes, entrando pela porta da sala. Eu mesma vi Papai Noel poucas vezes. O de verdade, digo, pois desde pequena já havia sido alertada por mamãe que Papai Noel de shopping é de mentirinha. Como a família não possuía as tais vestes vermelhas, sempre chegavam com uma história de que "Papai Noel não sabia que o natal ia ser aqui em casa, passou na casa da vovó antes e deixou os presentes lá. Tó o seu!" Esse ano, meu pai, exibicionista como sempre, decidiu esculachar com a imagem do bom velhinho e saiu pela casa se vestindo toscamente com o paletó vermelho e a barba sintética. "Eu enganei todos vocês! O Papai Noel que subiu no telhado da casa da vovó naquele natal era eu!", gritava meu pai em alegrias para mim e todos meus primos. Há quem tenha soltado risos de canto com tal graça, mas um ar de dúvida surgiu no ar. Meu priminho, o mais novo no recinto, ainda tinha esperanças nos presentes pedidos via cartinha, diretamente para o Pólo Norte, entregues direto pelas mãos do velho. Aprendeu as verdades da vida num baque de segundo. 

Há um tempinho atrás, na hora da ceia tão esperada -- pelos adultos por motivos óbvios e pelas crianças porque o fim da ceia era equivalente a abrir presentes --, os mais velhos sentavam-se à toalha florida de comidas rebuscadas enquanto as crianças se acomodavam no sofá, junto à programação comemorativa -- horrenda -- da tevê aberta, ao mesmo tempo em que, estabanadas, derrubavam arrozes e pedaços mal cortados daquelas carnes que ninguém sabe direito o que é. Ontem, com a ajuda de alguns bancos improvisados a mais, não duvido da possibilidade de sentarmos todos juntos à mesa para devorar loucamente a comida quando nem fome sentimos direito, em meio a milhões de assuntos paralelos muito diferentes entre si que, às vezes, se entrelaçam e confundem a mesa inteira. A partir daí, inicia-se outro assunto totalmente outro, e assim vai até a pausa para todos se atentarem à hora da sobremesa. Rabanada, rabanada... Se não fosse a presença de uma amiga de mamãe -- cozinheira por excelência -- não teríamos rabanada!

Poderia agora finalizar a crônica com lamúrias e saudosismos que de nada valeriam. Dizendo que doismiledez teve natal mais melancólico, faltando hipérboles, vovô Ivan, Icleia (viúva do meu finado vô que, espalhafatosa, fazia-se engraçada e extrememente brigável), tio Guto e as crianças (que já contei terem viajado), Tiquinha e Juju que só vem no vintecinco, tio Leo para encrencar com o mundo inteiro e aquele monte de criança pentelha correndo por todos os cantos. Mas acho que está bom assim. Não minto, pois foi também natal de alegrias e presentes emocionantes, aquele ditado dos pequenos frascos que todo mundo já está cansado de saber. Acabo este registro ao mesmo tempo em que, veja só!, o disco da Elis também se acaba -- "Pois vejo vir vindo no vento o cheiro da nova estação". O almoço do dia vinte e cinco (com os restos da fartura de ontem) me espera, com também uma certa parentada. Um beijo, bye bye, até logo e, sempre, "quaquaraquaquá", minha gente!

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